"Sede, portanto, perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito."
Corações que anseiam por ver a face do Senhor, por louvá-Lo em seu templo e por adentrar a sua santa habitação. Filhos que esperam para se juntar à multidão de gente de todas as nações, tribos, povos e línguas que, diante do cordeiro, proclamarão em forte voz a Salvação do nosso Deus (Ap 7,9-10). A casa que comunitariamente habitamos rejubila-se diante do acontecimento de vidas bem-aventuradas, possibilitadas no túmulo vazio. Decretamos o estabelecer da ressurreição à todas as pessoas, em todos os lugares, através dos tempos e culturas. Elevamos fecundas respostas de santidade diante da humanidade insaciável.
Em nós, pulsa o desejo pelo que é eterno. Transmite-se, em cada célula, o DNA de santificação injetado em nós pelo Criador. Nós somos a geração de ressuscitados que estabelece o novo homem regenerado no Cristo e vivificado pelo Espírito Santo. Em nós, pulsa o desejo pelo que é eterno. Transmite-se, em cada célula, o DNA de santificação injetado em nós pelo Criador. Nós somos a geração de ressuscitados que estabelece o novo homem regenerado no Cristo e vivificado pelo Espírito Santo. Há, portanto, uma possibilidade de vida que rompe sofismas materialistas: o Evangelho. Jaz, perpetuamente, hedonismos nocivos ao ser humano, pois um só sacrifício perfeito possibilitou libertação a todos os homens para todo o sempre.
A realidade de santidade que o Evangelho comporta não pode mais restringir-se a poucos, conforme outrora, mas amplia-se na medida em que revelamos a ressurreição a cada indivíduo, conforme o pedido do anjo: “Ide depressa contar, Ele ressuscitou dos mortos” (Mt 28,7). Não mais se cancela vidas ou se restringe aqueles que receberão a proposta Cristocêntrica, mas a todos revelam-se aquelas palavras que são Espírito e Vida (Jo 6,63). Todos assumem ministério profético no avanço do Reino, todos recebem as primícias sacrificiais de Jesus. A salvação não é eletiva, mas é direito de todos, pois o desejo mais intrínseco do homem é o de participar da santidade de Deus: este é o seu abismo que apenas a comunhão trinitária pode preencher. Jesus, portanto, continua a favorecer nos homens a unidade, a comunhão, a Koinonia.
Ao crer no ressuscitado, proclama-se com o próprio existir que aquele que é Santo é quem santifica os seus. Já não se trata mais de interpretações teológicas indiferentes ao homem, mas de uma teofania no ser. Eis porque a possibilidade de santidade se dá pela ressurreição: Jesus inaugura esse estilo de vida em sua própria carne. Mostrou-nos o caminho e assumiu em si os empecilhos e bloqueios manifestos pelo decair moral, psíquico e espiritual, efeitos do pecado.
Em sua cruz, acolheu-nos, dando-nos novas vestes (Lc 15,22), alvejadas em seu próprio sangue (Ap 7,14). Vestes que substituem as quinquilharias que carregávamos por causa de nossas iniquidades. O Senhor, em sua infinita bondade, vestiu-nos com vestes de santidade e resgatou o homem original, a partir do novo Adão. Na criação, Deus viu que tudo era muito bom (Gn 1,31). Aquele que é Santo e que vê a bondade da criação, sabe que esta é a própria santidade, dada por sua iniciativa de amor, que instaura em todo homem vivente seu bem-querer. O princípio, pois, de todas as coisas é princípio de santidade. Haja em vista o desvio do homem diante do projeto de Deus, a corrupção da humanidade santificada na criação dá-se na liberação da intervenção do inimigo de Deus e na opção do homem de distanciar-se do criador. O Pai, porém, insistentemente, recordou-nos o trajeto desejado por Ele.
O livro do Levítico – tantas vezes mal interpretado e mal recebido pela cristandade moderna – tem a revelação do porquê necessitamos ser santos: Porque Deus é Santo. (vide 11,44; 11,45; 19,2; 20,7; 20,26; 21,8; 22,16; 22,32). Se somos criados a sua imagem e semelhança, somos feitos a imagem e semelhança da santidade. A espera desta possibilidade inaugurada pelo Cristo, porém, viveram os profetas, patriarcas, reis e figuras anônimas: são a nuvem de testemunhas que nos fala a carta aos Hebreus, no capítulo 12. Só em Jesus, o homem viu – e tocou - a remissão, expiação e propiciação que permitiram a integridade completa, que é a santidade.
O Cristo, em todo o seu viver, proclamava os sinais de seu mistério: revelação, redenção e recapitulação. Como nos ensina o catecismo da Igreja Católica, no parágrafo 521, “tudo o que Cristo viveu, Ele próprio faz com que o possamos viver nele e Ele vive-lo em nós”. Por isso, “Jesus explicou, com toda simplicidade, o que é ser santo; assim o fez quando nos deixou as bem aventuranças” (GeE, §63): “Felizes os pobres no espírito, os que choram, os mansos, os que têm fome e sede de justiça, os misericordiosos, os puros no coração, os que promovem a paz, os perseguidos por causa da justiça e os caluniados por causa do Reino (Mt 5,1-11). Eis o que é ser santo: fazer dom de si mesmo. O evangelista finaliza o capítulo com uma ordem do próprio Jesus: “sede, portanto, perfeitos como o vosso Pai Celeste é perfeito (Mt 5,48). O estímulo a sermos santos provém daquele que é santo. Desta vez, porém, as palavras do levítico são ressignificadas em Cristo Jesus, explicitando-nos o desejo primordial de Deus.
Ensina-nos o Papa Francisco que “no fundo, a santidade (...) consiste em associar-se duma maneira única e pessoal à morte e ressurreição do Senhor, em morrer e ressuscitar continuamente com Ele” (GeE, §20). Em outras palavras, significa repetir a doação integral de si, conforme Cristo inaugurou. A raiz pessoal e primordial de santidade é o abandono no Senhor. Por sua vez, o abandonar-se, fazendo dom de si mesmo, só acontece nos corações apaixonados por Deus (entende-se, portanto, o porquê de o apóstolo utilizar a expressão “primeiro amor”). Ama-se, pois, porque Deus amou-nos por primeiro.
Se se ama o Senhor, decide-se por ser íntimo dele, por reconhecer sua voz, por atender o seu chamado, por corresponder com oferta de vida, por amar indiscriminadamente com amor purificante. Combata-se a ideia de que se pode amar a Deus sem, de fato, se relacionar com Ele.
Fato: é impossível a santidade sem amor.
Por brotar da fonte inesgotável de todo amor, a santidade é transbordar de Deus aos homens. Digo-te: ninguém que queira ser santo dará de si mesmo ou viverá a tentação de não amar, mas será capaz de dar o mais puro amor, de reavivar a experiência de compaixão no poço em Samaria e de tocar especialmente aqueles mais tentados a não se sentirem amados. O amor é face da misericórdia do Pai e, de todas as expressões de Deus, esta é a mais necessária neste tempo. Há homens que, desejosos de preencher-se com o amor pleno, ainda vivem a buscar fugacidades. Há de existir, sempre, santos que revelem o amor de Deus, pois estes hão de mostrar.
Sem desejo por santidade, todo seguimento é ilusório. Sem mudança interior, todo caminho é um desaguar do instinto mais díspar da presença santificante no tabernáculo do Senhor. Sem intimidade com o Senhor, não existe discípulo. Se era exigida a purificação do sacerdote que realizava sacrifícios no templo santo de Javé, e que apenas uma vez ao ano poderia adentrar o Santo dos Santos, quanto de mais de nós que temos a possibilidade de, pelo sangue de Jesus, acessar incessantemente o coração do Pai. Haja em vista, porém, que a purificação não é meritocraticamente possibilitada a nós, mas em virtude do cordeiro manso e humilde, que se deixou imolar em paixão por toda a humanidade.
Ninguém imagine ser possível uma bem-aventurança que não revele decisões, que não nos exijam rompimentos, purificações e conversões. Não coadunam, pois, ser santo e ser cheio de si. É, de fato, pelo renunciar que se avança no caminho de santidade. É, pois, só negando a si mesmo que se pode tomar a sua cruz e seguir Jesus (Lc 9,23). São estabelecidos, nos que se decidem por viver uma vida de eternidade, processos sólidos e permanentes. Finca-se o ser humano em contínuos crescimentos propositados no Senhor. Há dores no caminho, mas, acima de tudo, há liberação de vitória porque há manifestações tangíveis da glória do Senhor.
Santidade vive-se na coletividade – com os irmãos e com o mundo. É impossível ser santo sozinho, pois é no fruto coletivo que se autentica o poder, domínio e a autoridade espirituais dadas a nós da parte do Senhor. Se somos via de tradução de Deus aos homens, faz-se necessário, no processo comunicativo, que haja receptores desta mensagem. Todos quanto vivem díspares do projeto do Senhor para as suas vidas são campos de missão. Por isso eu vos digo a todos vós: santos, levantem-se (Lc 7,14). Não cessem de entoar cânticos novos na presença do Senhor (Sl 96,1). Haja sempre louvor a pulsar em vossos corações (Ef 5,19). Sejam um (Jo 17,11b). Proclamem que o louvor, a honra e a glória pertencem ao nosso Deus (Ap 5,9) e alegrai-vos (Fl 4,4), até que Ele venha.
Como filhos obedientes, não vos conformeis aos desejos de outrora, quando vivíeis ma ignorância. Antes, como é santo aquele que vos chama, tornai-vos santos, também vós, em todos vosso proceder. "
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